Mozal, Kenmare e Sasol: Casos de Impunidade Corporativa em Moçambique

Os mega-projectos em Moçambique tiveram o auge da sua entrada no país em meados dos anos 90 até início dos anos 2000. Actualmente, proliferam pelo país várias empresas transnacionais na busca de recursos naturais para explorar, exportar e lucrar sem se importar com as consequências ambientais, sociais e económicas que as suas actividades trazem para as comunidades afectadas e para Moçambique como um país.

Nos dias de hoje, ouvimos sempre falar dos grandes investimentos do gás do Rovuma atrelados a exemplos de abuso de poder, violação de direitos humanos e crimes ambientais sem precedentes. Mas parece que nos esquecemos que outros grandes investimentos que já existem no país há alguns anos, e que estes contribuíram muito para convidar outros monstros extractivistas a virem confortavelmente instalar-se em Moçambique sem qualquer preocupação com as leis ambientais e de direitos humanos em vigor. Após a adesão de Moçambique às instituições de Bretton Woods em 1984, os pioneiros do investimento directo estrangeiro em Moçambique, na área de megaprojectos, foram a Mozal (1997), a Sasol (2004) e a Kenmare (2007)1 que hoje representam autênticos exemplos de impunidade corporativa, pois encontraram terreno fértil para exercer suas actividades sem seguir os princípios e directrizes internacionais que pretendem orientar os grandes investimentos (uma vez que nem sequer existem leis internacionais vinculativas que obriguem as transnacionais a respeitar os direitos humanos ou o meio ambiente). Estas empresas aproveitam-se ainda do facto de estarem a operar num país onde o quadro legal e institucional que visa monitorar estas actividades, era e continua sendo precário, e muitas vezes até financiado pelos próprios mega-projectos.

Transnacionais como a Mozal, a Sasol e a Kenmare, apesar de actuarem em sectores distintos, são exemplos claros que, mesmo que passem muitos anos, as promessas feitas às comunidades locais dificilmente serão cumpridas. Todas estas empresas já operam há mais de 20 anos e já obtiveram lucros dos seus investimentos, e quase nada contribuíram para a melhoria de vida das comunidades afectadas, por outro lado deixam ficar uma factura ambiental, climática e social que Moçambique não estará em condições de pagar.

Estas empresas são financeiramente muito mais poderosas que o próprio Estado Moçambicano – uma vez que estão inseridas em cadeias globais de valor – e a comparticipação Moçambicana nestes projectos muitas vezes tem sido paga a título de empréstimo pelas próprias transnacionais, algumas das razões pelas quais as autoridades governamentais têm feito ouvidos de mercador às reclamações das comunidades que vivem os efeitos nefastos das actividades que estas empresas desenvolvem.

As emissões de poeiras emitidas pela Mozal na Matola continuam a acontecer sem que nada seja feito para salvaguardar a saúde dos Moçambicanos.

A Sasol, após ter beneficiado de um processo de reassentamento conduzido completamente fora dos padrões moral e legalmente aceitáveis, continua a explorar o gás natural de Pande e Temane sem contribuir sequer para a melhoria de vida das comunidades circunvizinhas, e a ignorar as reclamações que estas lhe trazem. Como se não bastasse, continua a avançar com novos projectos sem sequer ter o consentimento das comunidades afectadas, que já sentem que a terra pertence à empresa e não aos Moçambicanos.

A Kenmare, a explorar areias pesadas no norte de Moçambique, recebeu a concessão de exploração em um local que, apesar de histórico e sagrado, não escapou às pretensões económicas de um gigante sedento por engordar os cofres dos seus accionistas.

Todos os outros mega-projectos que vieram depois destes chegaram ao país com a certeza de que aqui encontrariam terreno fértil para facilmente violar os direitos humanos, ambientais, sociais e trabalhistas dos Moçambicanos sem nenhuma responsabilização. Muitos no país festejaram a entrada de mega-projectos por acreditar que o ambiente de negócios em Moçambique se tornou favorável ao investimento directo estrangeiro, sem no entanto perceber que o nosso país estava, sim, a tornar-se no mais recente eldorado económico onde os capitalistas globais poderiam garantir a acumulação de capital nas mãos das classes dominantes, às custas da maioria da população.

1 Wache, P. (2008),O Papel das Multinacionais na Promoção do Desenvolvimento das Comunidades Locais: o Caso da MOZAL em Moçambique. Tese de licenciatura defendida no ISRI.

Cario, S e Sigauque, E. (2015), Investimento Directo Externo e Desenvolvimento económico africano: Estudo de caso da economia moçambicana.

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