Dia Internacional dos Rios, o Zambeze e Mphanda Nkuwa

14 de Março: Dia Internacional dos Rios

Em alusão à data, a JA! organizou e realizou vários eventos. O foco foi o Rio Zambeze.

Em Tete, colocámos um banner na Ponte Samora Machel (com a mensagem: EM SEU NOME, O “PROGRESSO” E O “DESENVOLVIMENTO” VÃO MATANDO O ZAMBEZE BARRAGEM A BARRAGEM) e distribuímos panfletos sobre as consequências que a proposta barragem de Mphanda Nkuwa pode vir a ter se for construída. Em Maputo também colocámos banners em dois locais da cidade (um idêntico ao colocado em Tete e mais dois com a mensagem Água é Vida, sem água não há Vida) e foram igualmente distribuídos panfletos.

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Em Maputo e em parceria com o Instituto Nacional de Audiovisual e Cinema, organizamos ainda a projecção de dois documentários sobre o tema: Entre Rios, que retrata os impactos da urbanização e expansão da cidade de São Paulo sobre os rios da região, e Damocracy, que aborda os impactos sociais e ambientais da construção de mega barragens nos rios. O objectivo destas projecções, foi o de juntos reflectirmos sobre a importância dos rios e recursos hídricos, sendo estes um bem comum e vital para o planeta e todos nós. Após a apresentação dos documentários, seguiu-se um debate bastante interactivo que também serviu de reflexão no que diz respeito ao impacto da acção humana sobre o meio ambiente, seus recursos e a sustentabilidade dos mesmos. Foram também levantadas questões relacionadas com o modelo energético que, historicamente, tem causado graves consequências sociais, económicas, culturais e ambientais, sendo que há uma grande e urgente necessidade de substituição do uso de energias sujas e da construção de mega barragens (como a que se pretende para Mphanda Nkuwa) pelo desenvolvimento e uso de energias limpas e renováveis.

Dia dos Rios INAC

O ZAmbeze e Mphanda Nkuwa

Como manda a regra geopolítica neste tipo de coisas, conforme os países de primeiro mundo param de construir e começam a demolir as suas hidroeléctricas, a pressão das companhias e financiadores deste tipo de infraestruturas sobre os países subdesenvolvidos e em via de desenvolvimento aumenta.

Para não variar, o governo de Moçambique parece não estar a “ver o filme”. Com uma série de barragens planeadas para os nossos rios nos próximos anos, encabeçada pela mediática Mphanda Nkuwa, a sua agenda indica que está empenhado em enviar-nos no rumo contrário ao tal desenvolvimento que tão invariavelmente enche os seus discursos.

Em 2014, só nos Estados Unidos da América, pelo menos 72 barragens foram demolidas com a finalidade de restaurar os seus rios e preservar as suas gentes e biodiversidade. Lá, o movimento para demolição de barragens e restauração de rios está claramente cada vez mais forte pois, fruto de campanhas e programas de educação e informação, é cada vez maior a consciência dos impactos que as barragens têm, tiveram e poderão vir a ter nos rios onde existem, e assim, é cada vez menor o espaço de manobra para quem as promove dentro do meio político e é consequentemente menor o “à vontade” que os políticos têm para incuti-las à sociedade.

Mas quem e porquê é que decide que uma barragem deve ser demolida? Bem, na verdade, não parece haver uma regra. Por vezes são entidades governamentais que, por questões ambientais e sociais, o determinam; outras vezes, são mesmo as empresas proprietárias da barragem que, quando esta deixa de ser rentável (se é que alguma vez fora), chegam à conclusão que os custos de manutenção são superiores aos da demolição, e então, por questões financeiras e de segurança optam por demoli-la. A natureza agradece.

A grande vitória na luta contra as barragens em 2014 foi o cancelamento do projecto HidroAysén, um plano de construção de 5 barragens nos rios Baker e Pascua na Patagónia. O Estudo de Impacto Ambiental foi aprovado em 2011, mas um grupo de cidadãos opôs-se veementemente e em 2014 a Ministra do Ambiente anunciou que o seu ministério rejeitara o projecto. Justificou-o dizendo que a barragem punha em risco a biodiversidade, as culturas tradicionais, comunidades e mesmo o turismo da região.

Outra grande vitória foi conseguir responsabilizar o Banco Mundial pelo seu envolvimento em violações de direitos humanos através do seu financiamento de barragens, como por exemplo nos massacres do Rio Negro causados aquando da edificação da Hidroeléctrica de Chixoy na Guatemala.

Mas e nós? Até quando vamos andar para um lado quando o Mundo segue para outro? Somos e queremos continuar a ser diferentes, mas diferentes para melhor. Temos de impor a nossa vontade de modo a que sejam tomadas decisões sábias sobre estes assuntos, dos quais depende o bem estar e subsistência de milhões de pessoas e o equilíbrio do nosso meio ambiente. Concordamos que não podemos acreditar em tudo que se diz e escreve, mas também não podemos permitir que em nosso nome e de ânimo leve se tomem decisões tão obscenamente erradas que uma simples pesquisa online num qualquer motor de busca desclassifica perentoriamente.

Precisamos que os decisores deste país promovam um diálogo amplo e aberto com a sociedade sobre as necessidades energéticas do país, e que permitam que esta participe na tomada de decisão, colocando em cima da mesa respostas claras para perguntas como:

Precisamos de mais barragens para produzir energia para quê/quem?

Que tipo de energia queremos, e quais as opções que temos?

Em termos de justiça social, estamos certos que estas decisões, tomadas em conjunto com a sociedade, serão mais justas, mais válidas, e certamente não custarão tanto suor, sangue e lágrimas aos Moçambicanos. E quanto ao plano ambiental, temos fé que esta nos permita preservar os nossos rios, a nossa água.

No caso específico do Zambeze, o relatório do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), adverte que nos próximos anos “a bacia do Zambeze irá potencialmente enfrentar os piores efeitos das mudanças climáticas (…) e sofrerá, provavelmente, uma redução substancial na pluviosidade de cerca de 10-15%”. Não podemos nos dar ao luxo de ignorar estes avisos de painéis de cientistas de renome e levianamente construir mais barragens no Zambeze. As consequências poderão ser desastrosas.

Orgulhosos pelas vitórias dos nossos parceiros nos EUA e no Chile, mantemo-nos firmes na nossa luta e esperançosos até ao fim que a vitória nos sorria também. E você até é capaz de estar a pensar que essa tão almejada vitória não será sua; pior, que em caso de derrota, para si nada mudará; ou pior ainda, que esse investimento certamente servirá o país, criará postos de trabalho e trará progresso… Pense de novo. Esse investimento poderá afectar irremediavelmente a vida de milhões de Moçambicanos que vivem nas margens do Zambeze. Poderá tirar o peixe e a xima das suas mesas, pois da “saúde” de um rio depende todo um ecossistema, incluindo as machambas que ele irriga. Como sobreviverão esses milhares de pescadores e agricultores que vivem no e do rio?

E as possíveis repercussões no delta do Zambeze e na indústria do camarão?

E se lhe disséssemos que Mphanda Nkuwa não é para colmatar a paupérrima taxa de electrificação do país? Ficaria admirado? Que atrás de Mphanda Nkuwa há projectos de outras indústrias de alto consumo energético, sujas, e que trarão para o país outros problemas socioambientais e o mesmo desenvolvimento que a Hidroeléctrica de Cahora Bassa, a Mozal, a Vale e a Jindal, entre outros, até hoje trouxeram: insuficiente face ao sacrificado e desproporcionalmente distribuído.

O Zambeze é só um, e no entanto, são inúmeros os projectos que o executivo parece ter para ele, como se este fosse inesgotável e indestrutível… Não acha estranho que nenhum deles vise beneficiar directamente as suas gentes?

Acha mesmo que isso é progresso?

Para mais informação sobre o projecto HidroAysén e demoliçaõ de barragens:

http://news.nationalgeographic.com/news/energy/2014/06/140610-chile-hidroaysen-dam-patagonia-energy-environment/

http://www.americanrivers.org/initiative/dams/projects/2014-dam-removals/#sthash.PNG8jVEs.dpuf

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