CRIMINOSOS DO CLIMA: ENI e Shell, mantenham os combustíveis fósseis no solo! Não queremos as vossas florestas falsas!
13 de Maio, 2019
Uma nova estratégia apresentada pelas corporações de combustíveis fósseis para plantar árvores como “compensação” pelas mudanças climáticas não é apenas um truque de greenwashing, mas uma tática perigosa que pode exacerbar os problemas causados pela exploração de combustíveis fósseis.
As gigantes dos combustíveis fósseis ENI (Itália) e Shell (Holanda) anunciaram programas de reflorestação como compensação pelas emissões de carbono, num esforço para fazer greenwash ao modelo corporativo que tem causado devastação ambiental generalizada, usurpação de terras e destruição de meios de subsistência. As duas empresas são responsáveis por crimes e desastres ambientais como resultado das suas actividades de combustíveis fósseis, na Nigéria e em muitos outros lugares em todo o mundo.
A ENI está actualmente a passar por uma operação massiva para explorar novas reservas de gás no norte de Moçambique. Durante anos, a empresa iniciou uma queima de gás extremamente prejudicial no delta do Níger – uma prática que ainda está em andamento, muito tempo depois da ENI ter prometido deixar a queima de gás na sua Assembleia Geral Anual de 2011. Somente no ano passado, a comunidade Nigeriana de Ikebiri levou a ENI ao tribunal pela poluição das suas terras e água. A empresa também está em julgamento em Basilicata – uma pequena região do sul da Itália, apelidada de Texas Italiano por causa das suas actividades petrolíferas – onde a ENI é acusada de despejar lixo perigoso no meio ambiente.
A Shell é uma das dez maiores poluidoras do clima no mundo e, desde a década de 80, tem operado sabendo que a queima de petróleo e gás teria consequências desastrosas para o clima (i). No entanto, a empresa continua a gastar bilhões de dólares à procura de novos campos de petróleo e gás e gasta mais $49 milhões em cada ano a fazer lobby a políticas favoráveis aos combustíveis fósseis (ii). A Shell esteve envolvida, e os seus executivos provavelmente sabiam, em numerosos assassinatos, torturas e violações realizados por organizações paramilitares na Nigéria durante os anos 90. As suas actividades actuais em Groningen, na Holanda, são a causa dos terramotos que estão a destruir as casas das pessoas (iii).
Agora, a ENI e a Shell estão a promover uma tática nova e perigosa. A ENI anunciou planos para plantar 8,1 milhões de hectares de árvores em Moçambique, na África do Sul, no Gana e no Zimbabué (iv). O CEO Claudio Descalzi anunciou o objectivo da ENI de “alcançar emissões líquidas zero nos nossos negócios upstream até 2030”, na actualização da estratégia da empresa a 15 de Março de 2019. Enquanto isso, a Shell apresentou o seu plano, lançado em 2019, para reduzir a sua “pegada de emissões líquidas de carbono em 2% -3%”. O plano inclui reflorestação, com a empresa a oferecer créditos de carbono aos seus clientes para compensar as suas emissões (v). A Shell também está a impulsionar esquemas controversos, como a Redução de Emissões por Desflorestação e Degradação Florestal (REDD+), que não só não reduzem as emissões de gases com efeito de estufa, mas que levam à violação dos direitos ambientais e humanos, à exacerbação da corrupção e à captura corporativa de fundos vitais para o clima. Os projectos de REDD+ reduzem a natureza a uma mercadoria a ser comprada e vendida, e as comunidades locais são expulsas das suas terras em nome da “preservação” ou empregadas como conservacionistas privados, enquanto as práticas tradicionais de gestão da terra desaparecem. Enquanto isso, ao focar na responsabilidade da comunidade pela desflorestação, o papel central das grandes corporações e do Estado como principais actores na destruição ambiental é menosprezado.
A proteção dos ecossistemas naturais críticos, como mangais, florestas, dunas e zonas húmidas, é crucial e ajudará o planeta a absorver naturalmente as emissões de carbono, ao mesmo tempo que também fornece subsistência às comunidades locais e evita eventos climáticos extremos. Contudo, as estratégias apresentadas pela Shell e pela ENI nada farão para contribuir para estes objectivos – longe disso.
Resolver a crise climática requer cortes de emissões profundos, urgentes e imediatos, o que significa que a energia suja e prejudicial deve ser detida na fonte e não pode simplesmente ser “compensada” noutras partes do mundo. Os combustíveis fósseis devem ser deixados no solo mas, em vez disso, a ENI e a Shell nem sequer pretendem lidar com esta realidade até à data, investindo bilhões na procura de novas reservas.
Nós escrevemos esta declaração enquanto os impactos do Ciclone Idai ainda estão a ser sentidos. O ciclone e as inundações a ele relacionadas nas últimas semanas devastaram uma grande parte de Moçambique, do Zimbabué e do Malawi, tirando milhares de vidas e afectando milhões de pessoas. Os impactados são pessoas que não criaram a crise climática, enquanto a ENI e a Shell estão entre os responsáveis pela crise. Os povos do mundo, especialmente os mais pobres e vulneráveis que sofrem os piores efeitos das mudanças climáticas, não podem arcar com qualquer expansão adicional dos combustíveis fósseis.
Enfrentar verdadeiramente a crise climática significa alcançar “emissões zero” e NÃO “emissões líquidas zero”. Uma meta de “líquido zero” permite que poluidores como a ENI e a Shell continuem a poluir sob o pretexto de que possam usar plantações artificiais para “sugar” o carbono do ar noutras partes do mundo. De uma perspectiva de justiça climática, esta estratégia é completamente falhada. Não há garantia de que as plantações de árvores possam garantir a compensação de carbono a longo prazo. As plantações não podem e nunca poderão compensar a destruição do mundo natural: elas reduzem a biodiversidade, levam a solos esgotados e absorvem apenas uma fração do CO2 capturado pelas florestas reais.
Além disso, através deste plano, a ENI e a Shell pretendem introduzir as plantações de árvores numa área maior do que o Norte da Itália, a terra natal da ENI – ou o dobro do tamanho da Holanda, de onde a Shell faz parte. Isso levanta questões sérias. Onde é que na Terra a ENI vai plantar estes 8,1 milhões de hectares de florestas falsas? Onde está a terra para fazer isso, e de quem é a terra que eles vão usurpar para fazer esse plantio? O que diria a ENI se a situação se invertesse e os Africanos quisessem que em todo o Norte de Itália se plantassem árvores?
Não há terra não utilizada disponível a essa escala, o que significa que milhões de pessoas serão afectadas pela perda das suas terras, casas e florestas. Áreas repletas de biodiversidade tornar-se-ão plantações de monoculturas. Isto terá, sem dúvida, impactos calamitosos na soberania e nos direitos alimentares das pessoas em toda a África.
Nem a ENI nem a Shell têm o direito de impor tais plantações de árvores nas terras das comunidades locais e dos povos indígenas. Ao longo das gerações, as comunidades cuidaram das suas florestas, muitas vezes tendo que lutar contra os seus próprios governos para manterem a posse e o controlo. Muitas comunidades já estão a resistir à energia suja, aos agro-commodities, às infra-estruturas e aos grandes projectos comerciais que impulsionam a desflorestação. O novo espectro dos esquemas de “compensação” climáticos liderado pelas corporações de combustíveis fósseis mais sujas é uma afronta ridícula, que será combatida onde quer que esteja.
A justiça climática exige que a ENI e a Shell cortem imediatamente com as suas emissões na fonte. Desde a revolução industrial, a indústria dos combustíveis fósseis enriqueceu com a exploração das pessoas e da natureza, levando à destruição em grande escala e irreversível da atmosfera. Como tal, a ENI e a Shell têm uma dívida climática colossal com aqueles que sofrem as consequências dos impactos das mudanças climáticas. Ao mesmo tempo, a desflorestação representa um grave risco para as pessoas e para o planeta. Se quisermos ter alguma chance de interromper as crises inter-relacionadas das mudanças climáticas e da perda de biodiversidade, os combustíveis fósseis e a desflorestação têm de chegar ao fim.
Para parar de causar a crise climática, a ENI e a Shell têm de parar com os combustíveis fósseis e com a energia prejudicial na fonte. Não à usurpação de terras em África ou em qualquer outro lugar!
Não aos combustíveis fósseis! Não à energia suja e prejudicial! Não às falsas florestas! Sim às reduções reais, Não ao líquido zero! ENI e Shell, Parem com as vossas emissões na fonte!
Referências:
(i) https://en.milieudefensie.nl/climate-case-shell
(ii)https://leftfootforward.org/2019/03/report-uk-firms-are-the-biggest-spenders-in-global-climate-change-lobbying/
(iii)https://www.foei.org/news/these-eight-scandals-prove-shells-long-history-of-contempt-for-people-and-planet
(iv) https://www.ft.com/content/7c4d944e-470d-11e9-b168-96a37d002cd3
(v)https://www.shell.com/media/news-and-media-releases/2019/shell-invests-in-nature-to-tackle-co2-emissions.html
Signatários:
- Anabela Lemos, Justiça Ambiental/ Amigos da Terra Moçambique
- Bobby Peek, groundwork/ Amigos da Terra África do Sul
- Farai Maguwu, Centre for Natural Resource Governance, Zimbabué
- Nnimmo Bassey e Anabela Lemos, Rede Contra o REDD em África (NRAN)
- Giulia Franchi, Re:Common, Itália
- Karin Nansen, Presidente, Amigos da Terra Internacional
SIGNATÁRIOS ADICIONAIS:
N.º |
NOME DA PESSOA |
NOME DA ORGANIZAÇãO QUE ESTÁ A ASSINAR |
1 |
Ricardo Navarro |
CESTA/ Friends of the Earth El Salvador |
2 |
Maggie Mapondera |
WoMin African Alliance |
3 |
Martin Galea De Giovanni |
Friends of the Earth Malta |
4 |
Helen La Trobe |
Friends of the Earth Ghana |
5 |
Richard Dixon |
Friends of the Earth Scotland |
6 |
Víctor Barro |
Amigos de la Tierra (España) |
7 |
Janet Solomon |
Oceans Not Oil |
8 |
Desmond Dsa |
South Durban Community Environmental Alliance |
9 |
Nanna Clifforth |
NOAH Friends of the Earth Denmark |
10 |
Tom BK Goldtooth |
Indigenous Environmental Network |
11 |
Frank Muramuzi |
Friends of the Earth Uganda / NAPE |
12 |
Kureeba David |
Regional Coordinator Friends the Earth Africa |
13 |
Maria Selva Ortiz |
REDES – FoE Uruguay |
14 |
Camila Rolando Mazzuca |
EnvJustice |
15 |
Sam Mucunguzi |
Coordinator- Citizens’ Concern Africa -(CICOA) Uganda |
16 |
Michelle Pressend |
Environmental Humanities South (EHS), UCT |
17 |
Ivonne Yanez |
Accion Ecologica, Ecuador |
18 |
Almuth Ernsting |
Biofuelwatch, UK/US |
19 |
Martin Vilela |
Bolivian Platform on Climate Change |
20 |
Cindy Wiesner |
Grassroots Global Justice Alliance (US) |
21 |
Pennie Opal Plant |
Idle No More SF Bay |
22 |
Hemantha Withanage |
Centre for Environmental Justice/ Friends of the Earth Sri Lanka |
23 |
Pascoe Sabido |
Corporate Europe Observatory |
24 |
Yago Martínez Álvarez |
Ecologistas en Acción, Spain |
25 |
Alejandro Aleman |
Centro Humboldt, Nicaragua. |
26 |
Mercia Andrews |
Rural Women’s Assembly (southern Africa_ |
27 |
Lungisa Huna |
TCOE (Trust for Community Outreach and Education (South Africa) |
28 |
Larry Lohmann |
The Corner House, UK |
29 |
Antonio Zambrano |
Movimiento Ciudadano frente al Cambio Climático – MOCICC, Perú |
30 |
Choony Kim |
Korea Federation for Environmental Movement (KFEM/ FoE Korea) |
31 |
Juan Pablo Orrego |
ONG Ecosistemas – Chile |
32 |
Edwin Mumbere Fanta |
Kasese youth and women clean energy club, Uganda |
33 |
Logan Moodley |
KZNSFF |
34 |
Ayumi Fukakusa |
FoE Japan |
35 |
Bori Yordanova |
Za Zemiata – Friends of the Earth Bulgaria |
36 |
Luca Saltalamacchia |
Studio Legale Saltalamacchia |
37 |
Simon Taylor |
Global Witness |
38 |
Simon Counsell |
Rainforest Foundation UK |
39 |
Cadmus Atake-Enade |
Health of Mother Earth Foundation, Nigeria |
40 |
Marija Mileta |
Zelena akcija/FoE Croatia |
41 |
Dickens Kamugisha |
Africa Institute for Energy Governance (AFIEGO), Uganda |
42 |
Anna Barkered |
Latinamerikagrupperna / Solidarity Sweden-Latin America |
43 |
Teresa Perez |
World Rainforest Movement |
44 |
Yoram Banyenzaki |
Guild Presidents Forum on Governance (GPFOG), Uganda |
45 |
Eriel Deranger |
Indigenous Climate Action, Canada & member of the Athabasca Chipewyan First Nation |
46 |
Khalid Mather |
WildoceansSA |
47 |
Judy Bell |
FrackFreeSA |
48 |
Alejandra Porras |
COECOCEIBA – Amigos de la Tierra Costa Rica |
49 |
Eduardo Giesen |
Colectivo VientoSur – Chile |
50 |
Opio Christopher |
Oil Refinery Residents Association, ORRA – Uganda |
51 |
Ana Maria R. Nemenzo |
WomanHealth Philippines |
52 |
Alnoor Ladha |
The Rules Foundation |
53 |
Maxime Combes |
Attac France |
54 |
Niko van Rensburg |
Animalia Learning Center, Assagay, KZN, SA |
55 |
Ncobile Nkosi |
South African Youth Climate Change Coalition, South Africa, NWU,MP |
56 |
Wolfgang Kuhlmann |
ARA, Germany |
57 |
Godwin Ojo |
Environmental Rights Action/ Friends of the Earth Nigeria |
58 |
Bishop Geoff Davies/ Vaniola Makan |
SAFCEI – Southern African Faith Communities’ Environment Institute |
59 |
Evelyn Schönheit |
Forum Ökologie & Papier, Germany |
60 |
Louise Lindfors/ Anna Ushamba |
Afrikagrupperna |
61 |
Silvia Ribeiro |
ETC Group |
62 |
Khulekani Magwaza |
South African Youth Climate Change Coalition (SAYCCC) |
63 |
Alphonse Maindo |
Tropenbos DRC |
64 |
Stella Jegher |
Pro Natura / Friends of the Earth Switzerland |
65 |
Natalia Salvatico |
Amigos de la Tierra Argentina |
66 |
Robert Anderson |
Noordhoek Environmental Action Group South Africa |
67 |
Kwami Kpondzo |
Global Forest Coalition |
68 |
Amegadze Kokou |
Les Amis de la Terre-Togo |
69 |
Mikael Sundström |
Chair, Jordens Vänner – Friends of the Earth Sweden |
70 |
Dorothy Guerrero |
Global Justice Now (UK) |
71 |
Rose Williams |
Biowatch South Africa |
72 |
Glen Tyler-Davies |
350Africa.org |
73 |
Fernando Campos Costa |
FoE Brasil |
74 |
Vanessa Black |
Earthlife Africa Durban branch |
75 |
Ernst-Christoph Stolper |
BUND – Friends of the Earth Germany |
76 |
Robert Jereski |
New York Climate Action Group |
77 |
Olga Senova |
Russian Social Ecological Union – Friends of the Earth Russia |
78 |
Howard Wood OBE |
COAST, 2015 Goldman Award Recipient Scotland |
79 |
Ka Hsaw Wa |
EarthRights International |
80 |
Rossano Ercolini |
Zero Waste europe-Zero Waste Italy |
81 |
Àlex Guillamón |
Entrepueblos/Entrepobles/Entrepobos/Herriarte |
82 |
Jorge Varela Márquez |
Ambiente, Desarrollo y Capacitación |
83 |
Louise Colvin |
Ward Environmental Affairs Bluff South Africa |
84 |
Ode Rakhman |
WALHI/FoE Indonesia |
85 |
Syeda Rizwana Hasan |
BELA/FoE Bangladesh |
86 |
Kirant Kamal Samarung |
Kirant Indigenous Samarung Sangpang, Indigenous Knowledge and Peoples Network SWBC Nepal |
87 |
Sviatoslav Zabelin |
Socio-ecological union international |
88 |
Ikal Angelei |
Friends of Lake Turkana (FoLT) |
89 |
Meena Raman |
Sahabat Alam Malaysia (Friends of the Earth Malaysia) |
90 |
Juliette Renaud |
Amis de la Terre France (Friends of the Earth France) |
91 |
Sylvain Angerand |
Canopée Forêts Vivantes – France |
92 |
Christophe Murroccu |
Mouvement Ecologique (FoELux) |
93 |
Živa Kavka Gobbo |
Focus Association for Sustainable Development, Slovenia |
94 |
Bruno van PETEGHEM |
Association Toxicologie-Chimie – FRANCE |
95 |
Laura greco |
A Sud, Italy |
96 |
Prafulla Samantara |
Lokshakti Abhiyan, India |
97 |
Wendy Flannery |
Friends of the Earth Brisbane, Australia |
98 |
Katharine Lu / Karen Orenstein |
Friends of the Earth U.S. |
99 |
Karen Pickett |
Earth First!, Calif., B.A. Coalition for Headwaters |
100 |
Mary de Haas |
KZN Monitor |
101 |
Kristina Salmi and Jarrah Kollei |
Friends of the Earth Finland |
102 |
Jennifer Redner |
American Jewish World Service (AJWS) |
103 |
Beatriz Felipe Pérez |
Enginyeria Sense Fronteres |
104 |
James Whitehead |
Forest Peoples Programme |
105 |
Joan Deare |
Amnesty International Durban, South Africa |
106 |
Andrew Bennie |
Sustaining the Wild Coast |
107 |
Makoma Lekalakala |
Earthlife Africa Johannesburg |
108 |
Ivonne Ramos |
Saramanta Warmikuna Women’s Network |
109 |
Helena Paul |
EcoNexus |
~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~ fim ~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~