COMUNICADO DE IMPRENSA

em repúdio à opressão e violência contra jornalistas e activistas em Moçambique

Na noite de domingo, 23 de Agosto de 2020, o jornal Canal de Moçambique foi incendiado por bombas artesanais (cocktail molotov) por indivíduos supostamente não identificados.

O Canal de Moçambique é um jornal sério, profissional e de grande reputação e cumpre um papel fundamental na nossa sociedade, ao divulgar notícias e artigos a respeito de diversos assuntos de relevância para o país, incluindo mas não se limitando a questões de governação, corrupção, falta de transparência, violações de direitos humanos, entre outros. O diálogo livre, aberto e inclusivo é condição fundamental na construção de sociedades mais justas e equitativas.

Poucas horas antes da destruição dos escritórios do Canal de Moçambique, o jornalista e activista social Armando Nenane, que tem activamente criticado a corrupção estrutural do Estado e a apropriação privada de fundos concedidos pelas empresas transnacionais do gás, foi preso perto da sua residência. Embora preso por supostamente violar o Estado de Emergência, é sabido que o regime anda há muito a querer silenciar Armando Nenane, que já foi espancado pela polícia e ameaçado com um processo legal.

Ora, a mensagem dada é muito clara: não pode haver espaço para vozes críticas em Moçambique. Não pode haver espaço para se insurgir perante injustiças, esquemas de corrupção ou fraudes. Não pode haver espaço para um debate – urgentemente necessário – sobre um melhor projecto social para o país. Qualquer um que tente fazê-lo corre o risco de sentir os tentáculos longos e poderosos de um sistema que governa através da opressão e do medo.

Estes acontecimentos das últimas 24 horas, além de amargos, têm um sabor muito familiar. Jornalistas, académicos, activistas e organizações da sociedade civil que não ecoam o mantra do sistema têm sido sistematicamente perseguidos, ameaçados, reprimidos, silenciados, espancados ou assassinados.

Lembramos aqui Carlos Cardoso, jornalista assassinado em 2000, enquanto investigava a corrupção ligada à privatização do Banco de Moçambique.

Lembramos aqui António Siba-Siba Macuácua, economista assassinado em 2001, enquanto investigava a corrupção no Banco Austral.

Lembramos aqui Gilles Cistac, constitucionalista e professor assassinado em 2015, crítico acérrimo da corrupção do Estado que foi baleado após ter argumentado a favor de uma reforma de descentralização para o país.

Lembramos aqui Anastácio Matavele, activista e observador eleitoral, assassinado pela polícia em 2019, nas vésperas das eleições presidenciais do país.

Lembramos também centenas de outros casos de activistas, jornalistas e académicos, que individual ou colectivamente, têm trabalhado em prol da consolidação da democracia, da defesa dos direitos humanos, da protecção da natureza, e que são constantemente perseguidos, ameaçados, atacados ou processados devido ao seu papel e importância do que divulgam ou debatem. Lembramos aqui todas as Fátima Mimbire, Anabela Lemos, José Jaime Macuane, Izdine Achá, Estácio Valói, David Matsinhe, Matias Guente, Ericino de Salema, Jeremias Vunjanhe, Daniel Ribeiro, Amade Aboobacar, Omardine Omar e Ibrahimo Mbaruco (ainda desaparecido!). E tantos, tantos outros.

E lembramos igualmente as milhares de pessoas que diariamente se calam ou se curvam por força do medo, que são oprimidas pelo sistema de violência estrutural que se impôs na nossa sociedade e que cada dia retira mais vidas e direitos.

Levantamo-nos hoje contra os repetidos ataques ao direito à vida e à integridade física e moral de tantos Moçambicanos e Moçambicanas, supostamente salvaguardados no Artigo 40 da nossa Constituição. Levantamo-nos também em defesa da nossa liberdade de expressão, imprensa e direito à informação, supostamente salvaguardados no Artigo 48 da nossa Constituição. Levantamo-nos hoje contra os repetidos e sistemáticos ataques ao jornalismo e ao activismo em Moçambique.

Exigimos que Ibrahimo Mbaruco seja encontrado, com vida, e que sejam responsabilizados os envolvidos no seu desaparecimento!

Exigimos que se investigue profundamente quem são os responsáveis pelo ataque ao Canal de Moçambique, e que se responsabilizem os culpados, incluindo os seus autores morais!

Reiteramos a nossa solidariedade para com todos que levantam a voz perante injustiças!

“É proibido pôr algemas nas palavras” – Carlos Cardoso

Maputo, 25 de Agosto de 2020

Acção Académica para o Desenvolvimento das Comunidades Rurais (ADECRU)

ALTERNACTIVA pela Emancipação Social

Justiça Ambiental (JA!)

Kubecera – Tete

Observatório do Meio Rural (OMR)

Rede para Integração Social (RISC)

União Nacional de Camponeses (UNAC)

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