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Mais um mega projecto agrícola lançado em Moçambique

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Observamos com cepticismo as notícias sobre a sua cerimónia de lançamento. Para muitos de nós, foi a primeira vez que ouvimos falar do projecto. Mais um mega projecto carregado de ambiciosos e (alguns) nobres objectivos. Como tantos outros que o precederam e morreram sem alcançar metade do que se propunham fazer.

“Este mega projecto do meu Governo, que terá como finalidade tirar gradualmente as famílias rurais da pobreza, constitui o assumir do investimento nas famílias moçambicanas como mecanismo principal de promoção do desenvolvimento sustentável, integrado e inclusivo e redução das assimetrias regionais e locais”, disse Filipe Nyussi no lançamento do projecto.

É prematuro tecer grandes considerações ou comentários sobre o assunto pois ainda pouco se sabe. Não tivemos ainda acesso a qualquer documento sobre o projecto, e a pouca informação existente é a que circula nos principais meios de comunicação. No entanto, o simples facto de um projecto desta dimensão (pelos valores envolvidos e pelas 125 mil famílias de ditos beneficiários) ser lançado desta forma, leva nos a questionar: De onde saiu este projecto?

Uma vez mais, estamos perante uma abordagem do topo para a base. O projecto foi desenhado, discutido e lançado, sem dar oportunidade aos supostos beneficiários ou demais partes interessadas e/ou afectadas de participar da sua construção!

Com certeza haverá argumentos bastantes para justificar esta urgência em lançar o projecto, pois proceder a consultas públicas adequadas; envolver os inúmeros actores que lidam com as questões agrícolas como instituições de investigação, académicos, sociedade civil, organizações de base e de camponeses nas discussões sobre as prioridades para o desenvolvimento da agricultura camponesa; e desenhar o projecto com base num processo verdadeiramente aberto e transparente, levaria demasiado tempo.

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Para justificar a impaciência serão invocadas todas as mais nobres razões, como a necessidade urgente de apoiar o desenvolvimento da classe camponesa, dada a sua evidente pobreza e vulnerabilidade. Obviamente, voltarão também velhos e menos nobres argumentos, – que na verdade não passam de mera distracção – como acusar os que questionam o projecto de serem contra o desenvolvimento e/ou anti-patriotas.

Curiosamente, constata-se uma vez mais que o Banco Mundial e outras agências similares têm muito mais poder de influência nas decisões sobre o que pode ou não acontecer em Moçambique do que o povo Moçambicano. E muito embora, como já dissemos, nada saibamos ainda sobre o dito projecto, arriscamo-nos a adivinhar que o papel do Banco Mundial não se resuma apenas a financiamento. Por certo estiveram envolvidos na sua concepção, assegurando que o seu apoio altruísta vai principalmente para aquilo que lhes interessa, como o agro-negócio e as plantações florestais – monoculturas de espécies exóticas – que teimam em denominar de reflorestamento.

“Serão criados mais de 5 mil empregos no trabalho de plantações florestais, através do reflorestamento de mais de 1 600 hectares de terras degradadas.”

Segundo a informação nos meios de comunicação, este projecto foi concebido pelo MITADER e será sustentado pelo Banco Mundial! O casamento perfeito!

Ou seja, estamos em dívida para com o nosso governo (e não é dessa dívida oculta e ilegal que falamos)! Devemos-lhe um profundo agradecimento por nos presentear com mais um projecto para reduzir a pobreza já preparadinho e prontinho a consumir. Livre de fardos como pensar nestas coisas de desenvolvimento, pensar em estratégias inclusivas e participativas, pensar em como assegurar que as prioridades do campesinato são devidamente incluídas, e até de pensar em como queremos dispor dos nossos recursos e como queremos ver o nosso país nos próximos anos.

Para já, vamos aguardar que o entusiasmo se dissipe para podermos então tentar perceber como é que este mega projecto supostamente vai funcionar e, acima de tudo, como é que – ao contrário dos muitos outros que no passado surgiram da mesma forma, carregados das mesmas promessas e com idênticos rios de dinheiro para implementar – este vai finalmente tirar os moçambicanos da pobreza?

Quem até hoje saiu da pobreza na fantástica revolução verde? Quem saiu da pobreza a cultivar jatropha ou os demais biocombustíveis? Quem será que vai ganhar com o Prosavana? Alguém sempre lucra, mas quem? E a que custo? Quantas centenas de milhares de Moçambicanos “custam” estes projectos prontos com beneficiários incógnitos?

E embora, infelizmente, os equívocos e as falhas na comunicação sejam demasiadamente invocados para justificar a oposição da sociedade civil a tantos mega projectos, – apesar de nunca constituírem a razão principal – insiste-se em continuar a fazer as coisas na penumbra. Onde está a informação oficial sobre o projecto? Já foi inaugurado; já está a ser propagandeado na comunicação social; mas não está disponível nas páginas electrónicas das entidades envolvidas e sabe-se apenas o que foi noticiado.

Nós também gostariamos de acreditar e de partilhar desse entusiasmo, no entanto, o cepticismo há muito que tomou conta de nós. Adoptamos uma postura de “ver para crer”, e ainda não vimos nada…

 

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