Em Moçambique o direito a manifestação esta consagrado na Constituição da República e devidamente legislado desde 1991. Um direito constitucional que nos últimos tempos temos vindo a ser limitados em usufruir devido a um sistema que não aceita ouvir a opinião daqueles que supostamente os colocaram no poder. Em Estados que se dizem democráticos o homem e a mulher tem o direito de se manifestar contra tudo o que é adverso as suas aspirações de paz, justiça e bem estar social.
Em Moçambique faz algum tempo que temos visto o contrário, as organizações da sociedade civil, associações e diversas forças vivas da sociedade tem sido impedidas de se manifestarem quando o governo sente-se ameaçado pela temática sobre a qual se pretende manifestar. O pior mesmo, é a falta de entendimento sobre o que diz a lei no artigo 3, onde está claramente expresso que o direito à manifestação não depende de qualquer tipo de autorização, somente de uma comunicação por parte das entidades que tenham a intenção de realizar a tal manifestação. Com a eclosão da pandemia da Covid19, os argumentos começaram a girar em torno das restrições estabelecidas como forma de prevenção da doença.
No entanto, em outras partes do mundo onde ainda é possível o exercício da cidadania, as marchas ainda são possíveis porque é através das mesmas que os governos conseguem tomar decisões que vão de encontro com as reais necessidades das suas populações. Não são eleitos grupos que sejam a favor do partido no poder para apresentar discursos redigidos na base de uma orientação, não são lidos discursos que precisam de ser aprovados por quem vai receber a mensagem, são lidos discursos directos, objectivos e contundentes, que buscam visibilizar as diferentes problemáticas que preocupam a população local e que desafiam o bem estar das suas relações com as populações estrangeiras. São permitidos discursos de pessoas estrangeiras sem que estes corram o risco de serem deportados como já vimos acontecer em Moçambique.
Foi possível testemunhar isto, na cidade de Copenhagen, na Dinamarca, onde a NOAH – Friends of The Earth Dinamarca, convidou a Justiça Ambiental – Friends of the Earth Moçambique a participar em conservatórios com outros grupos activistas locais, e a conhecer as lutas locais. Nesta ocasião tivemos também a oportunidade de participar de duas marchas, uma que foi realizada no dia 01 de Maio e a outra no dia 07 de Maio.
A Marcha do dia 01 de Maio que participamos foi organizada pela esquerda radical e pelos curdos do movimento Rojava que defende as profundas conquistas políticas e sociais de um processo revolucionário que vem construindo um Estado radicalmente democrático, baseado em conselhos e comunas populares, uma ordem secular e multi-étnica, que incorpora de árabes a arménios, de muçulmanos a cristãos. Trata-se de um vigoroso movimento anti-patriarcal, liderado principalmente por mulheres, que grava fundo as suas marcas na institucionalidade e na vida cotidiana.
Esta marcha foi realizada de forma paralela com a marcha das uniões de trabalhadores, que obviamente também marchavam pelos direitos de trabalhadores e especialmente pelo sistema de fundo de pensões. As empresas de pensão funcionam como administradoras de seguros sociais para funcionários de grandes firmas. É comum muitas serem contratadas para gerirem os planos de aposentadoria complementar de empregadores. A lógica dos Fundos de Pensão é semelhante àquela do mercado financeiro, à medida que parcela dos valores são investidos em ações rentáveis e, assim, proporcionam-se meios de acréscimo de lucros.
Percebe-se também que esta é uma oportunidade de lucro para as empresas e possibilidade para o Estado dinamarquês promover seus interesses a partir do sector privado, com menos burocracias e entraves políticos. Basicamente, ao invés de pagarem os seus impostos directamente ao Estado, todos os trabalhadores dinamarqueses devem estar filiados a alguma união de trabalhadores que por sua vez possui um fundo onde mensalmente todos pagam uma taxa simbólica que no final pode ser usada para investir em diferentes negócios e desta forma fazer crescer o dinheiro dos contribuintes.
A marcha paralela, que foi onde nós participamos estava aberta a diferentes temáticas que preocupam a comunidade na Dinamarca e especialmente em Copenhagen, ao longo das diferentes demonstrações foi possível assistir a discursos sobre a Palestina, sobre os refugiados e sobre a necessidade de maior inclusão e construção de uma solidariedade massiva e real. Buscando consciencializar os jovens para juntarem-se às causas não para seguir tendências mas sim por perceber as implicações das mesmas.


No sábado seguinte, no dia 7 de Maio, tivemos a Marcha Climática: Política Solidária para Refugiados Agora. Uma marcha que apelava para uma maior consciencialização, responsabilização e envolvimento dos diferentes sectores da sociedade dinamarquesa sobre as políticas climáticas, económicas e de defesa que deslocam as pessoas e as matam.
Fomos convidados a discursar nesta marcha para demonstrar como os privilégios do mundo ocidental se baseia na pilhagem, exploração e exclusão de pessoas no sul global. Sendo assim, grupos da Colombia, México, Indonésia e Moçambique foram convidados a expor e visibilizar as problemáticas nos seus países e apelar para a solidariedade internacional e a resistência contra o sistema capitalista que só foca no lucro e coloca as populações do sul global com os seus meios de subsistência destruídos e sem grandes benefícios .
Como isto poderá ser feito?

Uma das formas é exigindo aos seus fundos de pensões que deixem de investir em empresas que fomentam a exploração de energias fósseis no mundo, companhias que não se importam em desapropriar terra a centenas de pessoas e bloquear os seus acessos a meios de subsistência fundamentais, utilizando fundos públicos, isto é fazendo as pessoas se tornarem cúmplices de um sistema capitalista que só beneficia o ocidente. Internamente espalhando discursos de investimento em energias verdes mas por detrás suportando agendas que priorizam a exploração de energias fosseis em países na América Latina, Ásia e África, literalmente varrendo a sujidade para debaixo de tapete.
Que podemos fazer aqui para alterar esta situacao???(