
Fez, em Março deste ano, 1 ano desde que a VALE Moçambique parou de explorar o carvão mineral no distrito de Moatize, província de Tete, deixando para trás milhares de famílias afectadas que ainda esperam compensações, reparações e justiça. Aquilo que para muitos parecia um rumor confirmou-se com o anúncio do Ministério de Recursos Minerais e Energia (MIREME), a 25 de Março de 2022, em que autorizava a venda dos activos da VALE Moçambique, ignorando o apelo de dezenas de organizações da sociedade civil que exigiam que a VALE resolvesse todos os seus pendentes antes de sair do país.
Numa carta aberta assinada por 29 organizações da sociedade civil e grupos afectados pela VALE, e enviada para o MIREME, estas afirmavam terem “envidado esforços para documentar e denunciar as graves e variadas violações de direitos humanos perpetradas pela empresa VALE Moçambique e o incumprimento das suas obrigações, incluindo a sua contribuição para a degradação ambiental no Distrito de Moatize. Existem ainda inúmeros processos legais em curso (…) contra a empresa VALE Moçambique, que devem ser finalizados antes que a venda seja autorizada por este Ministério.” Vários anexos foram enviados juntamente com a carta, para corroborar estas alegações. Não obstante, o governo fez-se de surdo e o Ministro dos Recursos Minerais e Energia autorizou a venda em menos de 20 dias após tomar posse – um recorde de rapidez numa decisão tão sensível quanto controversa.
As operações de exploração de carvão mineral na mina de Moatize (II, III e IV) passaram então para a gestão da empresa Vulcan Minerals, parte do grupo Indiano Jindal, que adquiriu os activos da VALE num negócio de cerca de 270 milhões de dólares. Importa lembrar que o grupo Jindal já vem explorando desde 2013 a mina de Chirodzi, no distrito de Marara, também na província de Tete, com um historial manchado de violações de Direitos Humanos e atropelos à legislação Moçambicana – apesar dos seus inúmeros selos de sustentabilidade e alegados compromissos com a responsabilidade social corporativa.

Um ano depois, o balanço do que se vive em Moatize vem confirmar os piores receios das comunidades locais e das organizações da sociedade civil: tudo continua na mesma. As centenas de oleiros e camponeses que foram expulsos das margens do rio pela VALE, onde praticavam as suas actividades de subsistência, continuam a participar nas intermináveis e desrespeitosas reuniões com o governo e a empresa, sem que se determine o valor que devem receber de compensação. As milhares de pessoas reassentadas continuam com os mesmos problemas, de Cateme a 25 de Setembro: casas mal construídas, falta de terra para fazerem as suas machambas, e falta de opções para ganhar o seu pão. As milhares de famílias que vivem ao redor da mina continuam a reclamar da poeira e das rachas, e a morrer de doenças respiratórias ou doenças ligadas ao stress cotidiano devido à situação em que vivem.
Vergonha na cara limpa-se com caras de Samora!
Para as grandes empresas mineradoras – seja a VALE, seja a Vulcan, seja qualquer outra transnacional – mais um ano sem pagar as devidas compensações às pessoas e comunidades afectadas pelas suas actividades significa mais lucro, e com alguma sorte, algumas destas pessoas que estão a reivindicar os seus direitos morrem ou desistem no processo. O tempo está sempre do seu lado: enquanto ministros conseguem analisar um processo de venda de milhões de dólares em menos de 20 dias, mais de 5 anos não são suficientes para pagar às famílias afectadas o que é seu de direito: compensação por expropriação. É por estas e por tantas outras que governos perdem o seu povo. Se algum lugar do nosso país simboliza tudo aquilo que o nosso modelo de ‘desenvolvimento’ extractivista, neoliberal e neocolonial não é – nem nunca será – capaz de trazer, esse lugar é Moatize. Com a sua insuportável poeira e um fedor de promessas falsas pelo ar.
